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  • A primeira edição do curso de engenharia reversa exclusivamente para mulheres reuniu 20 profissionais de todo o Brasil para 16 horas de aula. Na visão da professora, uma turma de mulheres sedentas por conhecimento e, agora, empoderadas para dar novos passos em suas carreiras.

    “Querer ser livre é também querer livres os outros”. Essa é uma frase famosa de uma das maiores expoentes históricas do feminismo, a filósofa francesa Simone de Beauvoir. Ela teve essa inspiração no seu livro mais famoso, "O Segundo Sexo", lançado há 75 anos. No contexto da vida dela, essa fala se refere ao relacionamento aberto que ela mantinha com o filósofo Jean-Paul Sartre, uma relação que durou 50 anos e chocava o povo da época.

    Ainda que a frase reflita um pensamento dela sobre uma relação pessoal, a temática da liberdade foi a grande linha-mestra de todas as suas obras e ajudou muitas mulheres a se encorajarem para promover mudanças em direção à sua própria liberdade.

    Trazendo para 2024, dá, tranquilamente, para pegar emprestada essa expressão tão verdadeira e colocá-la no contexto atual da mulher enquanto ser social. Qualquer mulher do século XXI que destrava algum nível significativo de liberdade, imediatamente tem vontade de que essa conquista chegue logo ao maior número possível de outras mulheres, afinal, “querer ser livre é também querer livres os outros”.

    Pois é isso que está acontecendo, neste momento mundial, no Brasil, no mercado de cibersegurança. A vontade da Mente Binária de abrir novos caminhos nesse mercado uniu mulheres na criação do primeiro curso de Engenharia Reversa gratuito para mulheres, o CodeHERS!

    A primeira edição aconteceu em julho de 2024, depois de meses de trabalho de bastidores sobre a abordagem do curso, o processo seletivo, a didática ideal etc. Foi assim que muitas mãos livres e libertadoras desenharam uma jornada de 16 horas para compartilhar os preceitos da engenharia reversa com mulheres que desejam projetar suas carreiras em direção à análise de malware: um comitê formado pela Gabrielle Alves, diretora financeira da Mente Binária, pela Gabriela Vicari, do conselho consultivo, pela Bianca Garcia, diretora pedagógica da Mente, pela Thayse Solis, analista de cibersegurança - red team, e professora convidada para fazer o CodeHERS acontecer, deu vida a esse projeto que apoia o espírito do nosso tempo: a liberdade, a inclusão e a equidade.

    Em busca de diminuir as diferenças

    Para se ter noção da importância de programas assim, na live de abertura da turma, a Bianca Garcia trouxe uma rica pesquisa sobre a mulher no contexto STEM (uma sigla em inglês para definir o grupo de disciplinas científicas, como ciência, tecnologia, engenharia e matemática). Ela levantou, entre outros fatos, que no Censo da Educação de 2018, as mulheres brasileiras ainda participavam com apenas 31% de presença nessas matérias STEM, em relação ao predomínio de 69% de homens.

    Ou seja, por mais que mulheres como a Simone de Beauvoir estejam falando em igualdade de gênero há mais de 70 anos, ainda hoje, vemos esses números desbalanceados, o que pede para que a sociedade se mova em um grande processo inclusivo para impulsionar aquelas que desejam explorar seus potenciais nessas áreas ainda tipicamente masculinas.

    Não basta lançar uma iniciativa, ela precisa fazer sentido

    A coisa tem que ser feita com estratégia bem pensada, considerando as fragilidades do sistema atual, que ainda limita ou intimida a presença feminina num ambiente com maioria de homens - por mais boa vontade que haja até mesmo deles. Um exemplo de como isso é impactante aconteceu na própria Mente Binária: Recentemente, quando estava sendo lançada a nova turma do curso A Arte da Engenharia Reversa, percebeu-se que só havia homens inscritos. Imediatamente, tomou-se a iniciativa de financiar o sorteio de duas vagas afirmativas para mulheres. E o que aconteceu? Uma das sorteadas não compareceu e a segunda sorteada conseguiu participar de apenas metade do curso.

    O que a equipe da Mente Binária observou dessa primeira iniciativa está nas palavras da diretora pedagógica Bianca: "Ficamos desapontados, mas isso nos fez pensar. Por que elas tiveram essa chance e não participaram? Poderíamos atribuir esse contexto a características individuais e causas isoladas. Mas decidimos voltar um pouco e pensar em como a sociedade trata as meninas engenheiras".

    A experiência, então, levou o time a considerar o contexto feminino: mulheres ainda estigmatizadas no setor, muitas delas com horários restritos por terem que cuidar de filhos, ou familiares em geral, agenda com a casa (ainda uma tarefa que predomina sobre a mulher) e, assim, a decisão de fechar a agenda para estudar acaba perdendo a prioridade para uma fila de outras urgências.

    Nasce o plano ideal

    "O Mercês entrou em contato comigo com uma ideia germinal de um curso de Engenharia Reversa para mulheres, considerando que elas se sentiriam mais à vontade com uma mulher facilitando", conta a professora do CodeHERS, Thayse Solis, continuando: "Eu achei a ideia muito legal porque, de fato, ainda tem uma minoria feminina nessa área. E topei!".

    A partir daí, o comitê de mãos libertadoras que já falamos lá em cima pegou firme a missão de entender como esse curso poderia caber na agenda feminina, como seria possível fazer a inclusão de mulheres diversas, como poderia reunir representatividades do Brasil inteiro, quais seriam os critérios para aprovação das vagas etc.

    Lição feita, formulários prontos, vagas proporcionais à demografia de cada região do País e o resultado: para as 20 vagas disponíveis na turma, duas centenas de respostas de mulheres interessadas no CodeHERS. "Foi maravilhoso! Durante as aulas, cada uma que abria o microfone tinha um sotaque diferente!", lembra Thayse, comemorando que valeram todos os esforços em compor um curso diverso e possível para mulheres. "Temos relatos ótimos, de mães solteiras, mulheres em transição de carreira…", conta ela.

    Ah, como foi pensado para mulheres com agendas de mulheres, ou seja, cheias de compromissos com os cuidados de outras pessoas, a primeira turma do Code Hers aconteceu em dois finais de semana, sábados e domingos, das 9h30 às 15h30, totalizando 16h de aprendizado, otimizando o tempo delas.

    O sonho acontecendo

    O que se viu nessas 16 horas foram mulheres autodeterminadas, sedentas por aprendizado técnico que as ajudassem a chegar aonde desejam. "Havia moças da área de física querendo mudar de área; Uma profissional experiente em segurança mas que nunca tinha lidado com engenharia reversa; Uma desenvolvedora que queria lidar com engenharia reversa em desenvolvimento; Mulheres mais jovens em início de carreira, e um ambiente livre de preconceito, com tranquilidade para aprender", lembra a professora.

    Uma das coisas que surpreendeu a Thayse foi a força intencional de aprendizagem delas. "A hora que eu falei 'O próximo assunto é Assembly', esperava que todas torcessem o nariz, como é o padrão na hora de falar disso. Só que nessa turma, todas vibraram que íamos falar desse assunto", conta ela, lembrando do clima de interatividade no processo, em que cada sotaque que vinha do microfone trazia uma dúvida, uma ideia, uma alavanca de aprendizagem de todas.

    Um curso e uma certeza que nasce

    Maria Eduarda PiresDireto de Camaragibe, uma cidade em Pernambuco, que fica a uma hora de Recife, a Maria Eduarda Pires, de 21 anos, enriquecia o grupo de sotaques da turma. Ela está entrando no sétimo período da faculdade de Ciência da Computação e faz 3 meses que está no primeiro estágio de trabalho de sua vida, na Bidweb Security, sediada em Recife. "Descobri a área de segurança sem querer e me apaixonei. Comecei a ir atrás de estágio na área, aí participei de uma imersão para mulheres na Bidweb. Foi uma semana de aprendizados, conheci pessoas e, quando surgiu a oportunidade do estágio, me candidatei e passei no processo", conta a estudante.

    O CodeHERS também chegou a ela "do nada", através do post de uma amiga. "Fiquei muito interessada pelo fato de ser para mulheres e por ser de engenharia reversa. Eu tinha muito interesse, mas não tinha muita intimidade com o tema. No estágio, até conheci muitas pessoas que manjam do assunto, mas eu me sentia 'para trás'. Então esse curso chegou na hora certa", comenta Maria Eduarda.

    Apesar da pouca idade, ela já sabe dos desafios de ser uma mulher em tecnologia e por isso valorizou uma turma exclusivamente feminina, num ambiente de trocas de experiências e de acolhimento: "Dá essa sensação de identificação".

    Ela, que já tinha vontade de ingressar na área, usou o curso não só para aprender, mas para tomar decisões mais empoderadas, como ela conta: "Apesar de gostar de segurança, eu não tinha certeza de que era pra mim. E o curso abriu portas, eu realmente me vi mais apaixonada. É isso que eu quero estudar, aprofundar e trabalhar no futuro".

     

     

    Quem viveu, viu

    Bridgette RomanA Briggette Román, ou apenas Bri, era outro dos sotaques diversos da turma. Peruana radicada no Brasil há 5 anos, ela acaba de concluir seu mestrado em programação em redes pela UFRGS. Vivendo em Campinas, hoje buscando se inserir na área de segurança, ela viu no curso a brecha que procurava: "Já estava em contato com a Sabrina [fundadora da comunidade Menina de Cybersec que também influenciou na criação do CodeHERS, e quando apareceu o CodeHERS, eu fui com tudo", conta Bri.

    "As explicações da Thayse eram muito didáticas, com muita paciência, com exemplos. Agora, com o curso, já tenho os passos iniciais para ter a curiosidade de como começar", ela diz, refletindo que a iniciativa do curso permitiu aliviar o sentimento de injustiça que ainda paira entre as mulheres nessa profissão. "Essa parceria que acabamos fazendo com as pessoas parece que fortalece. Temos uma comunidade para usar o material didático e responder dúvidas umas das outras", celebra ela.

    Voltando à Simone….

    Retomando nosso humilde empréstimo da frase de Simone De Beauvoir, que escrevemos aqui para você não ter que voltar lá para cima: “Querer ser livre é também querer livres os outros”... .todo esse movimento que o primeiro CodeHERS gerou na vida dessas pessoas faz justiça a esse pensamento. E a fala final da Thayse só reafirma isso:

    "Acredito que abrimos portas para enxergar as possibilidades de uso da engenharia reversa por essas mulheres. Agora que elas se fortaleceram, mesmo que entrem numa turma mista (com homens), elas já estão fortificadas, com bases sólidas. As vejo com mais coragem de se integrar a esse mercado predominantemente masculino. E agora não precisam mais ter vergonha e já conseguem se posicionar mais firme. Poder promover isso de uma maneira técnica é muito emocionante, porque ainda é raro".

     

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    Recommended Comments

    • Mente Binária
    Gabrielle Alves

    Posted

    Foi realmente incrível participar de todo esse processo. Saber que de alguma forma o curso pode ajudar e incentivar mais mulheres a seguir ou entrar nessa área com tão pouca representatividade feminina. 💜

    Caroline Lima

    Posted

    Quando terão novas edições? Adoraria participar, parece ser uma ótima experiência

    • Curtir 1
    • Mente Binária
    Gabrielle Alves

    Posted

    @Caroline Lima teremos outras edições sim. Acredito que não para esse ano de 2024, mas pro ano que vem com certeza. Aqui no portal temos uma comunidade só para mulheres criada pela professora do curso, se não estiver lá, seria legal se entrasse, um lugar para falar sobre Engenharia Reversa, onde também divulgaremos quando abrirmos as inscrições para uma nova turma. 💜

     

    • Mente Binária
    biancarvgarcia

    Posted

    Foi uma jornada encantadora participar da criação do CodeHers! <3 

    É bom demais poder pensar que juntas podemos dar passos certeiros rumo à equidade de gênero! 



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